A VERDADE DO EVANGELHO

MEMÓRIAS DE CHARLES G. FINNEY

por Charles G. Finney

CAPÍTULO XXXIII.

 
OS AVIVAMENTOS EM BOSTON, EM 1856-57-58

 

No outono seguinte aceitamos um convite para trabalhar novamente em Boston. Começamos nossas obras na Rua Park, e o Espírito de Deus manifestou imediatamente seu desejo por salvar almas. O primeiro sermão que preguei foi direcionado à análise da igreja, pois sempre começava tentando incitar um interesse minucioso entre os professores de religião, para assegurar a volta dos que haviam caído, e procurar por aqueles que estavam enganados, para se possível, trazê-los de volta a Cristo.

 

Depois que a congregação foi dispensada, o pastor estava comigo no púlpito e disse "Irmão Finney, desejo que o senhor entenda que preciso ouvir essas pregações tanto quanto qualquer membro dessa igreja. Tenho estado insatisfeito com minha vida espiritual há bastante tempo, e mandei chamar-lhe por minha conta, pelo bem de minha própria alma, bem como pelo bem da alma do povo." Em momentos diferentes, tínhamos conversas longas e muito interessantes. Ele parecia entregar seu coração plenamente a Deus. Certa noite numa reunião de conferência e oração, pelo que sei, ele relatou sua experiência ao povo, e disse-lhes que havia se convertido naquele mesmo dia.

 

É claro que isso causou uma profunda impressão na igreja e na congregação, e também em boa parte da cidade. Alguns dos pastores achavam que era uma injúria eu tornar público algo dessa natureza. Mas eu não considerava assim. Era claramente a melhor maneira que ele poderia usar para assegurar a salvação de seu povo, e calmamente calculada para gerar entre os professores de religião, um exame profundo de seus corações.

 

A obra foi bastante extensiva em Boston naquele inverno, e muitos casos de súbitas conversões aconteceram. Trabalhamos ali até a primavera, então achamos que era necessário retornar para nossas obras em casa. Mas era muito claro que a obra naquela cidade estava longe de ser terminada, e saímos dali com a promessa de que, se Deus quisesse, retornaríamos para obrar novamente no próximo inverno. Dessa forma, voltamos para Boston no ano seguinte.

 

Enquanto isso, um dos pastores daquela cidade, que estivera na Europa no inverno anterior, estava escrevendo alguns artigos, que foram publicados pelo Congregacionalista, em oposição a nosso retorno para lá. Ele considerava minha teologia, especialmente sobre o assunto da santificação, como infundada. Essa oposição surtiu certo efeito, e sentimos de imediato que havia um sentimento de irritação em meio ao povo cristão. Alguns dos principais membros de sua igreja, que no inverno anterior envolveram-se de corpo e alma na obra, mantiveram-se à distância, e nem sequer passavam perto de nossas reuniões. Era evidente que toda sua influência, que era considerável naquela época na cidade, era contra a obra. Isso deixou algumas boas pessoas entre seu povo, muito tristes.

 

Esse inverno de 1857-58 será lembrado como o tempo em que um grande avivamento prevaleceu por todos os estados do norte. Ele varreu a terra com tanto poder, que na época estimou-se que não menos que cinqüenta mil conversões ocorreram em uma única semana. Esse avivamento teve algumas características peculiarmente muito interessantes. Foi levado a uma grande extensão através de influências, tanto que os pastores quase foram desnecessários. Há muitos anos havia uma reunião diária de oração em Boston, e no outono anterior à grande explosão, a reunião diária de oração fora estabelecida na Rua Fulton, em Nova Iorque, e continua até hoje. De fato, reuniões diárias de oração foram estabelecidas por todos os estados do norte. Lembro-me que em uma de nossas reuniões de oração em Boston naquele inverno, um cavalheiro se levantou e disse "Eu sou de Omaha, no estado de Nebraska. Em minha viagem para o leste, encontrei uma reunião contínua de oração por todo o caminho. Contamos que haja mais ou menos três mil quilômetros entre Omaha e Boston, e aqui estamos numa reunião de oração com mais de três mil quilômetros de extensão.".

 

Em Boston tivemos que pelejar como já compartilhei, contra a influência divisiva, que retraíra e muito o interesse religioso de onde havíamos parado na primavera anterior. Contudo, a obra continuou a crescer continuamente, em meio a essas condições desfavoráveis. Estava claro que o Senhor pretendia chacoalhar Boston. Finalmente foi sugerido o estabelecimento de uma reunião de oração para executivos, ao meio dia, na capela da igreja do Velho Sul, que era de fácil acesso para os homens de negócios. O amigo cristão que nos hospedava assegurou o uso do local e fez propaganda da reunião. Mas se uma reunião como essa seria bem sucedida em Boston, naquela época, não era certo. No entanto, esse irmão convocou a reunião, e para a surpresa de quase todos, o lugar não somente estava lotado, mas multidões foram deixadas do lado de fora, não conseguindo entrar. Essa reunião continuou, dia após dia, com resultados maravilhosos. O local era, já de início, muito pequeno para eles, e outras reuniões diárias foram estabelecidas em outras partes da cidade.

 

A Sra. Finney também realizava suas reuniões de mulheres na grande sacristia da Rua Park. Essas reuniões se tornaram tão lotadas que as senhoras enchiam a sala, e ainda ficavam em pé do lado de fora da porta, até onde pudessem ouvir, por todos os lados.

 

Uma de nossas reuniões diárias era realizada na igreja da Rua Park, que ficava cheia sempre que estava aberta para oração, e esse também era o caso de muitas outras reuniões em diferentes partes da cidade. A população, tão grande era que parecia estar totalmente movida. Logo o avivamento se tornou abrangente demais para manter qualquer cálculo de número de pessoas convertidas, ou para permitir qualquer estimativa que se aproximasse da verdade. Todas as classes sociais participavam das reuniões para perguntas e respostas, em todos os lugares. Muitos dos Unitários ficaram grandemente interessados, e participavam largamente de nossas reuniões.

 

Esse avivamento é tão recente que não preciso falar muito sobre ele, e também porque se tornou quase que pleno sobre os estados do norte. As pessoas ali estavam em uma situação de tanta irritação, vexação e comprometimento com suas instituições peculiares, as quais vieram a ser criticadas por todos os lados, que o Espírito de Deus parecia ter sido afastado deles. Parecia não haver lugar para Ele nos corações das pessoas do Sul naquela época. Estimou-se que durante esse avivamento não menos que quinhentas mil almas se converteram neste país.

 

Como eu já disse, esse movimento foi alimentado em muito pela instrumentalidade de nossas reuniões de oração, visitas e conversas pessoais, pela distribuição de tratos e pelos enérgicos esforços dos homens e mulheres da sociedade. Até onde sei, pastores jamais se opuseram a tais esforços e creio até que simpatizavam com os mesmos. Mas havia uma confiança tão grande de que a oração prevaleceria que grande parte das pessoas parecia preferir reuniões de oração a reuniões de pregação. A impressão geral parecia ser "Já tivemos instrução o suficiente, é tempo de orarmos." As respostas a orações eram constantes, e tão impactantes a ponto de chamarem a atenção das pessoas por todo o país. Era evidente que em resposta à oração, as janelas dos céus foram abertas e o Espírito de Deus era derramado como um dilúvio. A Tribuna de Nova Iorque publicou naquela época várias edições extras, dando conta dos progressos do avivamento em diferentes partes dos Estados Unidos.

 

Comentei que alguns exemplos de conversões repentinas aconteceram em Boston nesse avivamento. Certo dia recebi uma carta anônima, de uma senhora, pedindo-me conselho sobre a situação de sua alma. Geralmente eu não prestava atenção a cartas anônimas, mas a caligrafia, o claro talento manifesto na composição, juntamente com a indiscutível sinceridade da escritora, levaram-me a dar-lhe uma atenção nada habitual. Ela concluía pedindo-me para responder, endereçando a resposta para a Sra. M, e para deixar com o sacristão da igreja onde eu pregaria naquela noite, que ela pegaria depois. Nessa época, eu pregava cada noite em uma igreja diferente. Respondi essa carta anônima, dizendo que eu não poderia dar-lhe o conselho que ela buscava, pois não conhecia o suficiente sua história, nem a real situação de sua mente. Mas ousaria chamar sua atenção a um fato que estava muito aparente, não somente em sua carta, mas também no fato de não colocar seu nome ali, de que ela era uma mulher orgulhosa, e que isso ela deveria considerar minuciosamente.

 

Deixei minha resposta com o sacristão, como ela solicitara, e na manhã seguinte uma senhora veio visitar-me. Logo que entrou, ela disse que era a mulher que escrevera a carta anônima, e havia vindo me visitar para dizer-me que eu estava errado ao pensar que ela era orgulhosa. Ela disse que estava bem longe disso, mas era parte da igreja Episcopal, e não queria desgraçar sua igreja ao revelar que não era convertida. Respondi "Foi orgulho de sua igreja, então, que lhe impediu de revelar seu nome." Isso a tocou tão profundamente que se levantou, e manifestadamente agitada, saiu da sala. Não esperava vê-la de novo, mas naquela noite, encontrei-a entre as pessoas na sacristia, depois da pregação, para a reunião de perguntas e respostas. Observei essa senhora. Ela era claramente uma mulher inteligente e de educação superior, e pude perceber que ela pertencia a uma sociedade culta. Mas ainda não sabia seu nome, pois nossa conversa naquela manhã durara não mais que um ou dois minutos, antes que ela deixasse a sala, como relatei. Conforme eu a observava, comentei baixinho com ela "E você aqui?" "Sim," ela respondeu, e baixou sua cabeça como se estivesse profundamente tocada. Conversei um pouco com ela, numa conversa calma e gentil, e aquela noite passou.

 

Nessas reuniões de perguntas e respostas, sempre destaquei a necessidade de submissão imediata a Cristo, levando-os face a face com esse dever, então chamava os que estavam preparados para se comprometerem de forma irrestrita a Cristo, para se ajoelharem. Percebi, quando fiz esse apelo, que ela foi uma das primeiras a fazer isso. Na manhã seguinte veio novamente visitar-me bem cedo. Logo que ficamos sozinhos, ela abriu seu coração para mim e disse "Vejo, Sr. Finney, que tenho sido muito orgulhosa. Vim contar-lhe quem sou, e contar-lhe fatos a respeito de minha história, para que o senhor saiba o que dizer para mim." Ela era como eu havia suposto, uma mulher da alta sociedade, esposa de um rico cavalheiro, que era um cético. Ela se tornara professora de religião, mas não era convertida. Foi muito franca nessa conversa, e abriu cordialmente sua mente para instruções, e naquele mesmo momento, ou talvez imediatamente depois, ela expressou sua esperança em Cristo, tornando-se uma genuína cristã. Ela é uma escritora admirável, e conseguia transcrever meus sermões com maior precisão do que qualquer pessoa que já conheci. Ela costumava sentar e escrever meus sermões com uma rapidez e precisão que eram surpreendentes. Ela enviava cópias de suas anotações para muitos de seus amigos, e dedicou-se ao máximo para assegurar a conversão de seus amigos em Boston e em outros lugares. Já me correspondi muito com essa senhora, e ela sempre manifestou a mesma sinceridade em sua religião, desde aquela época. Sempre tem uma boa obra em suas mãos, e trabalha muito pelos pobres, e por todas as classes sociais que precisam de sua instrução, sua simpatia e sua ajuda. Já passou por muitas pelejas em sua mente, sendo tão rodeada pelas tentações deste mundo. Mas creio que ela tem sido, e continuará sendo um lindo ornamento para a igreja de Cristo.

 

O avivamento se estendeu de Boston para Charlestown e Chelsea. Em pouco tempo, espalhou-se por todos os lados. Preguei na região leste de Boston e em Charlestown, e em Chelsea, onde o avivamento tornou-se muito abrangente e precioso, por um tempo considerável. Continuamos a trabalhar em Boston naquele inverno, até que era tempo de voltarmos para nossas obras em casa, na primavera. Quando saímos de lá, a obra estava em sua força total, sem qualquer abatimento aparente.

 

A igreja e o ministério neste país haviam se tornado tão envolvidos na promoção do avivamento, e o favor de Deus era tamanho em participar dos esforços de leigos e pastores, que decidi retornar à Inglaterra e passar mais uma temporada ali, para ver se a mesma influência não prevaleceria naquele país.

 

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